quinta-feira, 31 de março de 2016

Os pés de barro das três religiões monoteístas 2/3



2 - O  cristianismo

As origens objectivas do Cristianismo são mais claras e mais conhecidas, pelo menos na civilização ocidental, que as do Judaísmo ou Islamismo:
1 – Historicamente, o judeu Jesus nasceu de uma mulher chamada Maria, de pai desconhecido, supondo-se que tenha casado, já grávida de Jesus, com José, do qual teve outros filhos.
2 – Jesus, pelos trinta anos, sentiu-se inspirado para pregar uma nova doutrina, em parte oposta à da sua cultura judaica, baseada num princípio: o da Fraternidade Universal de todos os Homens, já que todos filhos do mesmo Deus a quem ele não chamava Javé (o Deus dos judeus) mas Pai. E isto contra a sociedade de então, baseada na escravatura e nas classes dominantes e exploradoras dos mais fracos, imperando a lei do sábado e a lei de Talião, do “olho por olho, dente por dente”, cortando com ambas, defendendo que “o sábado foi feito para o Homem e não o Homem para o sábado” e o “dar a outra face” perante uma agressão. (Diga-se, em abono da verdade, que a Lei de Talião é totalmente justa – “Amor com amor se paga!” – embora em nada ajude à acalmia entre desavindos…)
3 – O ambiente histórico de então era propício ao aproveitamento de ideias revolucionárias, como esta da Fraternidade Universal:
3.1 – Israel estava sob o domínio romano.
3.2 – Havia várias seitas religiosas que se queriam impor ao povo, como a dos fariseus, a dos saduceus, a dos essénios e até a dos zelotas, esta de cariz mais guerreiro, organizando-se para lutar contra o ocupante romano.
3.3 – Havia, entre o povo, a ideia de que o Messias anunciado, desde séculos, pelos profetas, estaria prestes a vir salvar Israel do seu opressor.
3.4 – O povo humilde e trabalhador era subjugado por impostos e pelas classes dominantes quer políticas quer religiosas, quando não escravizado.
4 – Jesus consegue reunir uma dúzia de discípulos à sua volta, discípulos que começam a considerá-lo como o Messias, o salvador, o prometido por Javé nos tempos passados, Messias que viria instaurar o reino definitivo de paz e prosperidade para Israel. É provável que Jesus se tenha convencido de tal prerrogativa: ser ele o Escolhido, o Eleito de Javé, já que possuía alguns poderes invulgares, como os de curandeiro e de adivinho. No entanto, declarou: “O meu reino não é deste mundo…”, criando a desilusão já entre os discípulos, já entre o povo que, depois de o aclamar: “Hossana, hossana ao Filho de David!”, gritou, perante Pilatos: “Crucifica-o, crucifica-o!”, considerando-o um impostor…
5 – Jesus morre. E cerca de 20 anos mais tarde, pelo ano 50, aparece Paulo de Tarso que, de perseguidor dos primeiros seguidores de Jesus, se torna um apóstolo, construindo a primeira teologia baseada num Jesus suposto filho de Deus que desceu do Céu à Terra para salvar a humanidade: judeus e gentios. Paulo - um homem culto e certamente com pretensões a ficar na História... -  é, sem dúvida, o criador do Cristianismo, uma seita religiosa a que ele teria o orgulho de presidir, organizando comunidades, com ou sem a colaboração dos discípulos.
6 – Entre 70 e 100 dC, escrevem-se os quatro evangelhos, dos quais não possuímos nenhum original mas apenas cópias do séc. III dC. Ali se elaborou toda uma história de um Jesus divinizado e, “obviamente!”, Filho de Deus.
É interessante constatar que os evangelistas – ou os copistas durante os dois séculos em que os originais se perderam – inventaram tudo o que puderam para divinizar Jesus e firmar na fé os entretanto muitos crentes que foram aderindo à nova religião, sobretudo os das classes mais baixas, escravizadas e exploradas, pois era sumamente convidativa a ideia da “Fraternidade Universal”, ao contrário do que acontecerá com o islamismo, 600 anos mais tarde, cujo convencimento foi feito pela espada. O resto das crenças ou… “crendices”, dogmas e credos, quer naquele tempo, quer ao longo dos séculos, veio por acréscimo. Aliás, a nova religião, para sê-lo, tinha de “meter” Deus e os seus mistérios no meio daquele revolucionário conceito. Outro conceito, este mágico: a Fé! “Quem crê em mim e na minha palavra terá a vida eterna!”; “Quem me vê a mim vê o Pai que me enviou!”; etc.
Os exemplos da tentativa de divinização de Jesus são notórios em cada passagem evangélica. Estão patentes sobretudo nos inúmeros milagres atribuídos a Jesus, milagres obviamente falsos e inventados, pois a terem sido verdadeiros, não teria havido ser humano à face da Terra então conhecida, desde Roma à Índia, que não tivesse vindo a Israel ver tal “fenómeno” produtor de milagres. Nem tão pouco os seus irmãos judeus o teriam odiado tanto a ponto de pedirem a sua morte e morte de cruz. É que isto de ressuscitar mortos com um abrir e fechar de olhos e de pôr cegos de nascença a ver ou coxos a andar… não é para qualquer um! E nada desta procissão de humanos consta da História! Assim, Lucas ocupou-se de divinizar Jesus ao modo dos deuses solares, fazendo-o nascer de uma virgem, com fenómenos celestiais a acompanhar tão fantástico acontecimento: Deus vindo do Céu à Terra, tomando a carne humana, em forma de menino… Marcos e Mateus encarregaram-se da invenção de milagres, mais este que aquele, culminando nos milagres que rodeiam a morte e ressurreição de Jesus, um deles totalmente fantasmagórico: os mortos terem-se levantado dos túmulos e terem passeado pela cidade… Sucedem-se as narrativas contraditórias do chamado fenómeno da ressurreição! E João empenhou-se, na esteira de Paulo, em elaborar uma teologia a condizer com os “factos” narrados pelos seus antecessores.
O cristianismo teve o seu grande impulso, quando o imperador Constantino, nos princípios do séc. IV, o declarou como religião oficial do Império, tornando-se imparável, a partir desse momento, espalhando-se por todo o vasto Império.

E aí temos uma religião que, após dois milénios de ter sido inventada, é praticada ou seguida por cerca de dois mil milhões de seres humanos, tendo-se, entretanto, dividido em três: católicos, ortodoxos e protestantes, divisão símbolo das lutas pelo poder: o de Roma, o de Constantinopla e o de Inglaterra, havendo inúmeras seitas de um e de outro lado. Todas estas cisões só revelam que Deus anda bem arredado dos que dizem – desonestamente, senão perfidamente! – pregá-lo, adorá-lo, segui-lo: os gurus ou “papas” de todas essas seitas.

Uma religião verdadeira e credível? – Não, obviamente! Aliás, os Homens “da Igreja”, com as suas hierarquias, adulteraram a mensagem original de Fraternidade Universal de Jesus, Jesus a quem, arrogando-se de possuir a VERDADE, chamam Filho de Deus e Nosso senhor!



3 comentários:

  1. Tudo o que fica dito será explanado aquando da análise crítica do Novo Testamento, análise que se seguirá à que estamos fazendo ao Antigo Testamento.

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  2. No próximo texto, abordaremos as origens do Islamismo. No outro - e para finalizar - tiraremos as conclusões que se impõem, fazendo, em comentário, alusão aos inúmeros crimes praticados em nome do Deus "clemente e misericordioso, um Deus de amor" que os gurus religiosos apregoam nas suas religiões. Haverá maior e mais convincente argumento contra a suposta verdade das religiões do que estes crimes que fazem parte indelével da História antiga e actual?

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  3. "Historicamente, o judeu Jesus nasceu..."
    Pelo que tenho lido não é assim tão histórico que o judeu Jesus tenha existido.
    Parece-me mais credível que, num processo semelhante ao da bíblia, a personagem literária de Jesus Cristo seja uma amálgama de várias pessoas, reais ou imaginarias.

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