segunda-feira, 28 de maio de 2012

A lição do esqueleto

Quando estudei no liceu, havia na sala de Ciências um esqueleto, ao lado de mapas vários dos vários sistemas que compõem o nosso organismo. E foram bons auxiliares visuais de aprendizagem de como está organizada e funciona esta maravilhosa máquina que é o nosso corpo. Agora, muitos anos já passados sobre este esqueleto e estes sistemas que me enformam o corpo, vêm-me à memória aqueloutros pelos quais aprendi, com forte relevo para o primeiro. É que, despojando-me, em momentos de silêncio interior, de todas as minhas carnes – cérebro incluído! – só me resta aquele amontoado de ossos que, por falta do sistema muscular de suporte, já nem se consegue manter de pé. Visão mórbida ou de realismo puro? E esta imagem acompanha-me e faz-me pensar: é assim que serei dentro de alguns anos, quando todos estes sistemas que agora me mantêm agarrados à vida deixarem de funcionar, no todo ou em parte. Regressarei, então, à terra, donde, afinal, tudo veio, donde afinal eu vim! E ela rapidamente consumirá as “matérias de fácil digerimento”; os ossos, no entanto, sendo mais duros de “roer”, perdurarão, por isso, mais tempo no Tempo, podendo levar séculos, milénios mesmo a decomporem-se. Mas será uma questão de tempo... A lição é: se todos seremos apenas ossos, porque tanto ódio, tanto desamor, tanto stress, tanta preocupação, tanta tristeza, tanta angústia, tanta ganância, tanta vilania, tanta guerra, tanto atentado ao corpo que nos traz vivos, mas sempre pensando em dar ao mesmo corpo-carne (os ossos são um tanto ou quanto ignorados, pois indiferentes aos prazeres da vida... – aliás só nos lembramos que nos mantêm as carnes no lugar, quando alguma fractura nos deixa coxeando...) o prazer e a ilusão da felicidade, nunca sabendo realmente onde está tão desejada e tão ambicionada condicionante das nossas vidas! (Não sabes que ela está nos pequenos prazeres que, dia a dia, se renovam? – interpelarão muitos.) Mas... ossos! Apenas ossos! Dentro de alguns anos! Sempre poucos! E, cada dia, mais perto do fim! Ah, se todos os homens fossem inteligentes ao ponto de compreender que, mesmo possuindo toda a riqueza do mundo, não conseguem livrar-se de tamanha realidade! Mas não: vivemos – vivem os senhores do mundo! – como se nunca mais acabássemos, como se nunca as nossas carnes voltassem à terra donde vieram, pelo Acaso ou por Sorte, chame-se ela divina, para os crentes, ou simplesmente privilégio para os que mais gostam de raciocinar com a Ciência! E assim, damos – dão esses “senhores”! – cabo do mundo onde, um dia, tivemos o privilégio de vir à vida, esquecendo tanta coisa, sobretudo que não estamos sozinhos e que, sozinhos, não seríamos nada nem... teríamos nada!... Mas, haja esperança! Não para os da nossa geração, nem sabemos quantas gerações ainda serão necessárias para que se consiga encontrar o equilíbrio. Um dia, no entanto, virá em que a Humanidade se guie por padrões de justiça e equidade, não igualizando tudo e todos, mas cada um recebendo conforme o seu trabalho e a suas capacidades, nada de essencial faltando a ninguém! Começando logo pelo equilíbrio da espécie: quantos humanos o Planeta poderá suportar para que seja sustentável e todos tenham, ao menos, que comer, água e ar puros para beber e respirar?! Claro que a Eternidade - essa miteriosa realidade ou fantasia! - pode bem esperar...

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Mês de Maio, mês de Maria, mês de Fátima (3/3)

Mas, afinal, Maria, quem foste, quem és tu? Partamos da História para a análise filosófica do fenómeno “Maria”. Ali, por Nazaré, nos finais do primeiro século a.C., de uma mãe, Ana, e de um pai, Joaquim, nasceu uma criança do sexo feminino a quem deram o nome de Maria. Ao criar-se a religião cristã, a partir dos meados do séc. I, com Paulo a ser o seu grande mentor, embora não dando relevo à mãe de Jesus, Maria, a quem parece nunca ter feito referência (aliás, Paulo continuava com a machismo bíblico, considerando as mulheres inaptas para a pregação e para a direcção do culto ou das assembleias – vejam-se as suas cartas), teve forçosamente de ser dada importância à mãe daquele que seria feito o Cristo, o Messias, o Ungido de Deus, melhor – ou o cúmulo?! – o Filho desse mesmo Deus, de seu nome terreno Jesus. Desde a antiguidade conhecida, a tradição religiosa, cheia de deuses que têm avassalado a História o Homem, sempre impôs que os seus deuses – ora antropomórficos, ora de origem astral, ora assumindo formas de animais – nascessem de Virgens. Ora, sendo Jesus, Filho de Deus e sendo ele filho de Maria, Maria teria de ser Virgem. Logo, Maria, passou naturalmente a Virgem Maria! Tal designativo perde-se no tempo da Tradição cristã, não se sabendo ao certo quando terá sido atribuído a Maria. Muitos, aliás, confundem a tradicional virgindade de Maria com a Imaculada Conceição, ou concepção, dogma proclamado pelo papa Pio IX, em 1854, anunciando ex-catedra, (todos os católicos tendo de acreditar sob pena de serem excomungados da Igreja, pois, assim falando, o papa é infalível - outro dogma, o da infalibilidade pontifícia, proclamado pelo Concílio Vaticano I, em 1870) que Maria nascera de sua mãe Ana – Sta Ana – sem trazer consigo o estigma do pecado original, não necessitando, por isso, de ser baptizada para retirar tal estigma... Do inconcebível e quase romântico pecado original, invenção dos autores bíblicos de c. 500 a.C., não falemos mais! Só é de admirar como se faz um dogma com obrigatoriedade de crença de algo inexistente, pois os seus intérpretes – Adão e Eva – simplesmente não existiram, não passando de figuras míticas e de fábulas, como de fábula se trata o Éden ou o Paraíso onde Deus os criou e “os fez homem e mulher”, com a árvore da sabedoria e a serpente a tentar a mulher, tentando esta, por sua vez, o “pobre” do Adão..., pois todos sabemos, desde Darwin, que a existência do Homem deu-se pela evolução das espécies e não por qualquer acto de Criação divina... Mais caricata é a fórmula usada pelo evangelista Lucas para começar a implementar tal opinião: Maria, prometida a José, apareceu grávida, não sabendo este o que fazer: se aceitá-la assim, se repudiá-la, vindo, então, um anjo explicar-lhe – explicou?!!! – que Maria estava grávida por obra e graça do Divino Espírito Santo. Ora José, naquela altura, nunca deveria ter pensado em tal ser divino que assim engravidara a sua prometida. Mas, enfim, justo e temente a Deus como parece ter sido, lá aceitou o veredicto. No entanto, depois daquele primeiro nado, teve com Maria vários outros filhos, como dão testemunho os evangelhos naquilo que de histórico ainda se pode retirar deles: “Estão ali a tua mãe e os teus irmãos que te querem falar...” (Mt 12,47) O facto de Maria aparecer grávida – Maria, certamente, uma moça bonita! – pode perfeitamente atribuir-se ao abuso de algum soldado romano – o exército invasor – pois, antigamente como hoje, os invasores sempre abusaram, sem pejo e sem dó nem piedade, dos seres mais fracos dos povos invadidos: as suas mulheres. Mas Maria passou Virgem para a História do cristianismo. E tantas foram as emoções que tão estranho suposto facto causou que Maria se tornou a maior vedeta de santuários e de onomástica jamais conhecida para um ser humano. Além de “Mãe dos Homens e Mãe de Deus, ou mãe da Terra e mãe do Céu”, quantos nomes tem ela por esse mundo religioso fora? Só em Portugal, serão centenas. Ignoro se há algum estudo para apurar tal onomástica. E não vale a pena referir exemplos. O nome mais bizarro, por estranho, que parece vir da Idade Média, é o da “Nossa Senhora do Ó”, referindo-se à sua “santa e miraculosa” gravidez. Maria! E Maria pode ser o nome da nossa mãe (certamente o nome mais comum de mulher, pelo menos, em Portugal) e foi o nome da mãe de Jesus. Simplesmente!...

domingo, 13 de maio de 2012

Mês de Maio, mês de Maria, mês de Fátima (2/3)

Mais um 13 de Maio! Ontem! Mais espectáculos cheios de emoção religiosa, manifestamente naqueles cânticos de adeus à Virgem, mas, mais em pormenor, nas muitas promessas pagas, pessoas rodando de joelhos à volta da capelinha das aparições – coisa que a TV não mostrou, e bem (ou mal?!) – mas mostrando a desenfreada corrida à compra de velas – 19 toneladas vendidas no dia 12! – para, em chamas, serem atiradas à pira onde, com cheiro detestável a cera queimada, ardiam sem cessar, em honra da Virgem! Curioso ou extremamente deprimente?! Comentavam que o exagero era devido à crise e aos pedidos incessantes à Virgem para que nenhum dos seus devotos perdesse o emprego ou recuperasse rapidamente o perdido! Ah, a quanta alienação a necessidade obriga, santo Deus! E, claro, tudo aproveitado pelos negociantes da dita cera e, obviamente, a Igreja, em cujas caixas de esmolas, espalhadas por toda a parte, muitos milhares devem ter entrado... Então, se mais não houver em fenómeno tal, pelo menos salvem-se... o turismo e o negócio religiosos! Num momento do mundo em que a crise económico-financeira afecta milhões de pessoas, agravando, para muitas, a sua precaridade e as suas dificuldades em satisfazer as necessidades básicas de alimentação, habitação, educação e saúde, filosofar sobre as religiões ou sobre o fenómeno religioso, desmistificando-o, colocando-o ao nível da crendice que é manifestação da irracionalidade humana e não dignifica o Homem exactamente no que ele tem de mais nobre: a sua inteligência e a sua razão ou capacidade de raciocinar, analisar, criticar para então decidir ou se decidir..., não será certamente a forma mais adequada de ajudar esses biliões que maiores vítimas são da crise. As razões da crise são fáceis de elencar: descontrole total das finanças a nível mundial, inversão total de valores pondo-se as sociedades ao serviço da economia e não a economia ao serviço das sociedades, ganância e corrupção a todos os níveis, injustiças – ou falta de justiça! – para promover a igualdade em direitos e deveres e a fraternidade, elegendo-se o DINHEIRO e o PRAZER como os deuses do Homem actual, levando ao individualismo, os ricos explorando cada vez mais quem não consegue – ou não quer, por corrupto! – entrar no sistema! Neste mundo-cão, o turismo religioso é uma tábua de salvação para muitos: agentes turísticos, empregando imensa mão-de-obra, apoios logísticos de hotelaria e restauração, venda de artefactos religiosos aos devotos de tradições, festas e romarias em honra de santos, concentrações em santuários, etc. Como filósofo realista, tenho de aceitar, dadas as circunstâncias de necessidades básicas referidas, a perversidade de que se revestem as crenças e crendices de que as religiões organizadas são a maior manifestação fraudulenta porque enganadora das mentes, ao venderem falsidades ou, se quiserem em termos mais soft, inverdades como se fossem a VERDADE, incrivelmente a única Verdade, ilógica logo à partida, tendo em conta as inúmeras religiões e seitas que avassalam o mundo e que convencem biliões, tendo cada uma milhões de adeptos. Incrível: ninguém questiona, ninguém critica, ninguém formula juízos! O mais simples seria exactamente a partir do facto de todas as religiões dizerem possuir a VERDADE. Bastaria esta convicção imposta aos respectivos fiéis para que estes duvidassem da sua veracidade. Mas... não! Os respectivos mentores religiosos não o permitem, normalmente com ameaças de morte, de preferência eterna, num qualquer inferno! Inacreditável! Perverso! Mas... eficaz: os biliões que se deixam levar pelas religiões são disso a mais evidente prova! De qualquer modo, que aproveite aos trabalhadores do turismo religioso! Já não se perde tudo... Em Portugal, Fátima é o máximo exemplo. Talvez a crise não diminua o fluxo de peregrinos e as unidades hoteleiras se encham e o comércio de santas e santinhas floresça. E isso não é tudo bom para esta sociedade de consumo, sociedade tão injusta e ingrata mesmo – e sobretudo! – para os que querem trabalhar, ter uma família, um lar, um lugar ao Sol na vida? – A resposta só pode ser afirmativa. Então, “Viva a religião!” Viva o turismo religioso que dá de comer a tanta boca faminta!” Actividade que, de algum modo, põe justiça ou ordem numa sociedade tão injusta e tão mal organizada pelos Homens – eu diria com mais propriedade! – pelos homens, pois as mulheres têm sido postas à margem das decisões políticas, económicas e financeiras que comandam os destinos do mundo e das sociedades.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Mês de Maio, mês de Maria, mês de Fátima (1/3)

Mês de Maio, mês de Maria, mês de Fátima (1/3) Para além do que escrevemos aqui, entre Junho e Setembro de 2011 (12 textos), analisando o fenómeno de Fátima a partir de dentro, isto é, partindo da análise das supostas mensagens do anjo e da Virgem aos pastorinhos, para aquilatar da sua inveracidade, não será despiciendo colocar a hipótese, já ventilada por alguns, de o fenómeno Fátima se tratar de um verdadeiro crime. Mas expliquemos! Que crime? – O crime de lavagem ao cérebro de crianças indefesas, quer física quer emocionalmente. Na parte física, porque, sendo frágeis e mal alimentadas, não se lhes deveria/poderia pedir sacrifícios – como cilícios, privação do alimento, que já era parco – em oferta agradável a Deus, pela conversão dos “pobres” pecadores e desagravo às ofensas com que Nosso Senhor era quotidianamente ofendido, etc., etc. No campo emocional, é de bradar aos céus o que se fez àquelas crianças: o pavor do Inferno já para eles, já para os “pobres” pecadores, o pavor do diabo, o pavor da guerra, o pavor/dever de desagravarem a Nosso Senhor que estava muito ofendido, o rezarem todos os dias pela conversão da Rússia que com o comunismo ameaçava a Fé no mundo, etc, etc. Um ror de pavores que alienaram aquelas crianças até à exaustão e alucinação. Qualquer criança, naquele estado, veria anjos e virgens que lhes “aparecessem em qualquer lugar”, tendo-lhes sido pregado tal, na Missa ou no confessionário, apelando a tamanhos sacrifícios de desagravo. Então, quem foram os criminosos ou quem é acusado como tal? – O clero de Ourém! É ele que deveria ser responsabilizado por aqueles atentados à integridade física e emocional de três crianças. Os efeitos foram tão devastadores que duas delas vieram a morrer, por fragilizadas, de pneumónica, conseguindo a mais velha, talvez por mais defesas físicas e psíquicas, sobreviver, mas logo enclausurada em convento das carmelitas, para que a (In)verdade das aparições nunca fosse questionada ou posta em causa, já que, segundo o princípio da Ciência, para que algo se possa afirmar como verdadeiro, real ou existente, é necessário prová-lo como tal e sujeitá-lo ao veredicto da dúvida cartesiana. Ora, nada disso se pôde fazer com os dois que morreram. (Interessante e incongruente: então, se a Senhora queria fazer passar a sua mensagem aos Homens, como enviada do Divino, deixava morrer logo ali duas das suas escolhidas testemunhas? Quem entenderá tal nonsense, para não lhe chamar outro designativo mais forte e apropriado? Parece-se com as aparições de Cristo após a sua suposta Ressurreição: apareceu apenas aos seus e não a todo o mundo conhecido de então, incluindo os seus algozes fariseus. Era assim que pretendia que a sua mensagem fosse clara e abrangente e credível por toda a gente? – Impossível de acreditar que Cristo fosse tão pouco inteligente que tal não fizesse para atingir os seus objectivos. Ora, deixando tudo nebuloso, só acredita quem se quer deixar levar... Tal como aqui!) Também com a sobrevivente Lúcia, o método científico não pôde ser aplicado: enclausurada no convento de imediato, obrigada a total silêncio! É que não convinha ao Clero, que tal fenómeno congeminara e do qual se estava a sair maravilhosamente – aqui, sim, atingindo os seus “devotos” objectivos de devoção à Virgem, renome da terrinha de Ourém, negócio óptimo pela certa para a Igreja e turismo local... – não lhe convinha que se soubesse mais do que aquilo que a Virgem supostamente já tinha comunicado à Terra!... Afinal, que castigo mereceriam aqueles senhores que levaram à morte as duas pobres crianças? Não deveriam ser acusados, pelo menos, de assassínio involuntário? Mas Fátima continua sendo crime, crime já não praticado contra crianças indefesas, mas contra fiéis devotos (e incultos!) que, subjugados ao absurdo de promessas feitas aquando em aflição, se arrastam – com o beneplácito sorridente do clero actual, papa incluído! – gotejando sangue, suor e lágrimas, rodando de joelhos à volta da capelinha das aparições ou esperando o milagre ou agradecendo um que supostamente lhe foi concedido por intercessão da Virgem inexistente de Fátima... Aliás, já por lá viram, rastejando, algum clero ou algum intelectual crente (sê-lo-á?!)?... Salve-se o turismo que dá de comer a muita gente, gente que, de outra forma, não teria trabalho ou emprego!... Mas – pergunta a que ninguém sabe responder, segredo bem guardado pela hierarquia do lugar! – para onde vão os milhões de esmolas que ficam nos cofres da Virgem, na capelinha e na basílica de Fátima? Quanto vai para a Igreja de Roma, isto é, para alimentar o rico Vaticano? Quanto para obras de misericórdia? Quanto para sufrágio das almas do purgatório? Quanto para o desagravar das ofensas com que os “pobres pecadores” ofendem Nosso Senhor, segundo a mensagem de Fátima aos pobres pastorinhos?... Da simpática figura que é Maria, falaremos em outros textos, repondo a verdade histórica e, ao mesmo tempo, as lendas – são tantas! – que em seu redor se formaram.