sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Onde a Verdade de Bíblia? - Análise crítica - Novo Testamento (NT) - 289/?

 

À procura da VERDADE nos Evangelhos

Evangelho segundo S. LUCAS – 7/?

 – Outro episódio narrado apenas por Lucas e que não nos deixa de intrigar, é passado em casa de um fariseu que convidara Jesus para uma refeição:

“Apareceu então certa mulher, conhecida na cidade como pecadora. Ela, sabendo que Jesus estava à mesa na casa do fariseu, levou um frasco de alabastro com perfume. A mulher colocou-se por detrás, chorando aos pés de Jesus. Com as lágrimas banhava-Lhe os pés e enxugava-os com os seus cabelos; cobria-os de beijos e ungia-os com perfume. Vendo isso, o fariseu que havia convidado Jesus, pensou: «Se este homem fosse mesmo um profeta, saberia que a mulher que Lhe está a tocar é pecadora.» (…) Jesus disse-lhe: «Quando entrei em tua casa, não Me ofereceste água para lavar os pés; ela porém, banhou-Me os pés com lágrimas e enxugou-os com os cabelos. Não me deste o beijo de saudação; ela porém, desde que entrei, não deixou de Me beijar os pés. Não derramaste óleo na minha cabeça; ela porém ungiu-Me os pés com perfume. (…) A quem muito amou, muito foi perdoado.» (…) Então, Jesus disse à mulher: «Os teus pecados estão perdoados. Vai em paz! A tua fé te salvou.» (Lc 7,37-50)

– Escreve bem este Lucas! A cena, assim descrita, é comovente, toca a alma… Não sabemos que sentimento levou aquela mulher, rotulada de pecadora, a prostrar-se aos pés de Jesus, chorando, enxugando, beijando, ungindo… Que pretenderia ela realmente? Que lhe fossem perdoados os pecados e, em seguida, deixar aquela “vida”? Como veria ela Jesus? Como um belo homem para ser amado ou como um profeta, um enviado de Deus com poder de perdoar pecados?

Presume-se que fosse prostituta. Logo… pecadora aos olhos do “mundo”! Então, onde teria ela a condenação? No tempo, enquanto a troco de boa soma, embora, assumia comportamentos de risco, de violência, de doenças, de indesejáveis gravidezes, atormentando-lhe assim corpo e alma com permanentes receios ou… nessa misteriosa eternidade apregoada por esse misterioso Jesus? É que a prostituta, a sociedade aceita e… condena, usa e… condena, chama chaga social mas fecha os olhos e não sabe ou não quer encontrar razões da sua existência e do facto de ser profissão tão velha como a humanidade… De facto, pode afirmar-se que desempenha uma função social e, por isso, tolerável aos olhos de todos embora ninguém queira aceitar, por pruridos de uma falsa pureza da sociedade…

No entanto, ali, não seria de esperar outra coisa de Jesus senão defendê-la. Embora talvez não de maneira tão convincente, tão insistente, tão… “apaixonada”!

Resta-nos perguntar onde estará agora essa mulher que, embora anónima, também será lembrada enquanto houver homens que leiam estes testemunhos acerca de Jesus Cristo. Teria voltado à “vida”, estando agora no inferno, ou, tendo-se dedicado à caridade e a outros amores mais puros, está, desde há dois mil anos, na bem-aventurança do Céu? Quiséramos tanto saber, não é?!…

Lembraremos, no entanto, que o inferno não existe e que o Céu – infelizmente, tão infelizmente, meu Deus! – também não. Por isso, é fácil a resposta…

Enfim, a cena não deixa de ser, por um lado, uma manifestação de amor, de coragem, de arrependimento, por parte de uma mulher que estaria carente de afectos, já que só receberia enxovalhos de quem dela usava e abusava, fosse ou não a troco de algumas moedas sofridas e envenenadas, sem um sorriso, um carinho, uma palavra de simpatia…; por outro, revela-nos um Jesus no seu melhor, defendendo um dos elos mais fracos da sociedade.

sábado, 21 de novembro de 2020

Onde a Verdade da Bíblia? - Análise crítica - Novo Testamento (NT) - 288/?

 

À procura da VERDADE nos Evangelhos 

Evangelho segundo S. LUCAS – 6/?

– Eis um milagre apenas narrado por Lucas: “O morto era o filho único de uma viúva. Grande multidão ia com ela no funeral. Ao vê-la, Jesus teve compaixão dela e disse-lhe: «Não chores!» Depois, aproximou-Se, tocou no caixão e os que o transportavam, pararam. Então, Jesus disse: «Jovem, eu te ordeno, levanta-te!» O morto sentou-se e começou a falar. (…) A notícia do facto espalhou-se pela Judeia e por toda a redondeza.” (Lc 7,12-17)

– É um estrondoso milagre que nos leva a perguntar por que razão os outros evangelistas não o referem. Não será maior milagre ressuscitar um morto do que curar um doente? – Talvez não! Quando se trata do divino, o poder está acima da matéria seja para lhe devolver a vida seja para inverter o seu curso numa qualquer doença…

Aqui, a grande questão permanece: “Porque é que vendo tamanho milagre, perante tantas testemunhas, não se tornaram todas essas testemunhas em apóstolos de Cristo, pregando a toda a humanidade a Boa Nova? Pois, imaginemos que tal facto se passava hoje, não numa aldeia desconhecida do mundo mas numa grande cidade, num funeral de herói ou de santo, onde houvesse total cobertura televisiva… Quem não acreditaria em quem tal milagre fizesse? Quem, vendo com os próprios olhos o morto que estava ali, de novo vivo e, falando com ele, não se renderia à evidência do sobrenatural, do Além, da mensagem que tal mensageiro pregasse? Então, porque espera Deus para vir cá de novo e proceder de tal modo, já que a vinda de Jesus, há 2000 anos, ainda não deu os frutos esperados?” - desculpem-nos esta pergunta já várias vezes repetida. É que não só não deu frutos como parece ter sido “muito trabalho” para tão pouco proveito, apresentando-se, aos olhos de um crítico, como projecto inconcebível num humano quanto mais em Deus…

E lá se vão perdendo, nos milhões que morrem dia a dia, tantos possíveis eleitos que, sem acreditarem, não vão parar ao Céu mas sabe-se lá aonde!… É: se o Deus de Jesus Cristo realmente existe, terá forçosamente de no-Lo enviar de novo e agora e já, na era das novas tecnologias, para que nenhuma das suas “ovelhas”, que somos todos nós, se perca. De outro modo, toda a sua suposta manifestação aos Homens através do seu suposto Filho, há dois mil anos, deixa de ter qualquer credibilidade.

Assim como deixam de ter qualquer credibilidade todos os supostos milagres narrados nos evangelhos. O de hoje, também. Aqui, foi Lucas a dar asas à sua imaginação de escriba, lançando mais uma acha na fogueira da Fé e conquistar mais crentes para a religião que se estava implementando.

 

sábado, 14 de novembro de 2020

Onde a Verdade da Bíblia? - Análise crítica - Novo Testamento (NT) - 287/?

 

 

À procura da VERDADE nos Evangelhos 

Evangelho segundo S. LUCAS – 5/?

– No sermão das bem-aventuranças, Mateus omite e Lucas acrescenta a parte condenatória: “Mas ai de vós, os ricos, porque já tendes a vossa recompensa! Ai de vós que agora tendes fartura, porque ireis passar fome! Ai de vós que agora rides porque ireis ficar aflitos e chorar! Ai de vós se todos vos elogiam porque era assim que os vossos antepassados tratavam os falsos profetas.” (Lc 6,24-26)

– Nunca entenderemos porque é que o Reino de Deus é apenas para os pobres e os humildes… Ou porque é que esses hão-de ter uma bem-aventurança eterna e os outros uma condenação também eterna…

Ou porque é que quem chora agora vai rir depois e quem ri agora tem de depois chorar… Pois, para quê o sofrimento agora ou depois? Porque não fartura e gozo e riso e felicidade para todos no tempo e na eternidade se a houver? Não seria este o grande objectivo humano e muito mais divino, em relação ao Homem, em vez de passarmos o pouco tempo que temos de vida a condenar uns e a exaltar os outros? Terão realmente algum sentido aquelas condenações bem como a frase: “Quem se humilha será exaltado e quem se exalta será humilhado.”? (Lc 14,11; 18,9-14)

– Aqui, vale a pena repetir o que é talvez o ponto mais alto - e mais revolucionário em relação às Escrituras do “Olho por olho, dente por dente judaico tradicional”! - da mensagem de Jesus Cristo: “Amai os vossos inimigos e fazei o bem aos que vos odeiam. Desejai o bem aos que vos amaldiçoam e rezai por aqueles que vos caluniam. Se alguém vos bater numa face, oferecei-lhe também a outra. Se alguém vos levar a capa, deixai que leve também a camisa. Dá a quem te pede e se alguém se apodera do que é teu, não lhe peças que to devolva. Fazei aos outros o que desejais que os outros vos façam a vós. Pois… se amais somente os que vos amam,… se fazeis o bem somente aos que vos fazem bem,… se emprestais somente àqueles de quem esperais receber,…. que merecimento tereis? Vós, amai os inimigos, fazei o bem e emprestai sem esperar coisa alguma em troca. Assim tereis uma grande recompensa e sereis filhos do Altíssimo.” (Lc 6,27-35)

– Fantástico! Que paz universal, meu Deus, com tal programa de atitudes! Como deixaria de haver inimigos e pobres e ladrões e traficantes pois todos pensariam em dar sem receber, desejar o bem aos que amaldiçoam, perdoando e sendo perdoados, oferecendo a outra face ao agressor que perdera o controle, vindo pedir-nos desculpa, depois, envergonhado perante a nossa tamanha dignidade!…

Mas… utópico ou possível? Mesmo que seja utópico, não deixa de ser tremendamente belo!

Só não sabemos onde é que vamos receber a recompensa de tal procedimento, se na Terra se no Céu, se no tempo, se na eternidade... Nem o que é sermos filhos do Altíssimo. Nem quem é o Altíssimo. Nem se o sermos seus filhos nos leva a essa vida eterna…

Enfim, das várias máximas de construção da fraternidade universal preconizadas – quase todas de difícil execução devido ao caracter tendencialmente perverso e egoísta do ser humano – é sem dúvida paradigmática e contundente aquela: “Fazei aos outros o que desejais que os outros vos façam a vós.” E teríamos uma sociedade perfeita, sem todas essas guerras, fomes, injustiças, tantos crimes de Homens contra outros Homens!

Grande Jesus Cristo! Que pena que a “tua” sociedade continue sendo uma desesperante utopia!

sexta-feira, 6 de novembro de 2020

Onde a Verdade da Bíblia? - Análise crítica - Novo Testamento (NT) - 286/?

 

À procura da VERDADE nos Evangelhos 

Evangelho segundo S. LUCAS – 4/?

 – “Quando se completaram os oito dias para a circuncisão do menino, deram-lhe o nome de Jesus. (…) E levaram o menino a Jerusalém para o apresentarem ao Senhor. (…) Havia em Jerusalém um homem chamado Simeão. (…) Movido pelo Espírito Santo, Simeão foi ao Templo. Quando os pais levaram o menino (…), Simeão tomou-O nos braços e louvou a Deus, dizendo: «Agora, Senhor, podes deixar partir o teu servo em paz. Porque os meus olhos viram a tua salvação que preparaste diante de todos os povos: luz para iluminar as nações e glória do teu povo Israel.» (…) E disse a Maria: «Eis que este menino vai ser causa de queda e elevação de muitos em Israel. Ele será um sinal de contradição. Quanto a ti, uma espada de dor há-de atravessar a tua alma.»” (Lc 2,21-35)

– É episódio também apenas narrado por Lucas. A profecia de Simeão realizar-se-á. Mas, quando Lucas escreve, tudo isto já tinha acontecido, umas dezenas de anos antes: Jesus, sinal de contradição, a dor de Maria vendo Jesus morrer na cruz, etc.… Só resta perguntar quem terá constatado toda esta cena devota e dela reteve memória.

– A encerrar a narrativa da infância de Jesus – narrativa que os outros três evangelistas omitem – vem o episódio talvez o mais pitoresco de todos os Evangelhos, mas não deixando de nos intrigar pela sua imprevisibilidade: “Quando o menino completou doze anos, subiram a Jerusalém para a festa da Páscoa. Passados os dias da Páscoa, voltaram mas o Menino Jesus ficou em Jerusalém, sem que seus pais o notassem. Pensando que o menino estivesse na caravana, caminharam um dia inteiro. Depois, começaram a procurá-lo e, não o tendo encontrado, voltaram a Jerusalém. Três dias depois, encontraram-no no Templo. Estava sentado no meio dos doutores a ouvi-los e a fazer-lhes perguntas. (…) Ao vê-lo, sua mãe disse-lhe: «Meu filho, porque fizeste isto connosco? Olha que teu pai e eu andávamos angustiados à tua procura.» Jesus respondeu: «Porque me procuráveis? Não sabíeis que eu devia estar na casa de meu Pai?» Mas eles não compreenderam o que o menino acabava de lhes dizer.” (Lc 2,42-51)

– Poderíamos dizer que nós também não compreendemos. Aliás, que pais compreenderiam? E como saberiam que Ele deveria estar na casa de seu Pai? E é com algum sentimento de crítica que constatamos tal atitude de Jesus e tal resposta sem um pedido de desculpas, como se os sentimentos de uns pais aflitos e angustiados fossem assim para deitar fora… Não o são para os Homens, porquê o seriam para Deus?

É! Lá que tivesse as suas razões “divinas” (teria?!), aceita-se, embora devesse ter delas avisado os seus pais. Agora que nem desculpa peça por tal acto, para Ele plenamente justificado, não se admite…

E porque é que o Templo é a casa do Pai de Jesus Cristo? Mesmo simbolicamente, porque atribuir uma casa a Deus? Em vez de “casa de meu Pai”, Jesus deveria ter dado o exemplo e ter desmistificado tal realidade que, se levou a que se construíssem tantas obras de arte que são património da humanidade, também deturpou a ideia de Deus, humanizando-O, localizando-O, fechando-O em Igrejas e sacrários, quando Deus tem de estar em toda a parte, em todo o lugar, em todo o tempo, em todas as coisas, porque é eterno e infinito e tudo o que existe nele está contido e não o contrário…

Enfim, que perguntas faria Ele aos doutores? Não conhecia Ele, como Deus, desde toda a eternidade, tudo o que os doutores sabiam? Ou… era já para os experimentar? Já para lhes exacerbar corpo e alma e O levarem à morte, como levaram vinte e um anos mais tarde, cumprindo assim as tais Escrituras, inspiradas por aquele seu Pai?

A ser verdade a dicotomia Deus-homem em Jesus, isso constituiria sempre um mistério. Aprenderia Ele como homem aquilo que já sabia como Deus? Aliás, que cérebro informaria Jesus, aos 12 anos? Um cérebro em desenvolvimento, como o de qualquer jovem, e que se ia apercebendo de que era informado por uma realidade… divina ou um já “Deus em corpo pequeno”?

Mais uma vez, a resposta mais sensata é a de que estamos não no campo histórico, mas no campo da fantasia, construindo-se uma personagem que viria a tornar-se o centro de uma religião nascente.