domingo, 28 de dezembro de 2014

Como será o mundo sem religiões? Mais selvagem ou mais fraterno?


 Diz-se que o “Homem é um animal religioso”. Os racionalistas, na linha dos cartesianos, de Espinoza e, mais tarde, de Einstein, estão convictos de que as religiões actualmente existentes, por absurdas e irracionais, com fundamentos históricos nada credíveis e sobretudo pelos seus deuses antropomórficos, isto é, criados à imagem e semelhança do Homem, têm os dias contados. Só resta saber quando e como será o seu fim. Assim, a pergunta em epígrafe tem todo o cabimento. Por outro lado, sendo certo que o Homem é um animal religioso, poderá também perguntar-se como o será sem religiões, melhor, sem as religiões actuais. Diríamos que é possível ser-se religioso sem seguir a crença em qualquer dessas religiões. O Homem será sempre um ser religioso porque sempre incapaz de abarcar e compreender toda a realidade que o rodeia, do átomo ao Universo, passando pela sua própria constituição ou essência: um ser físico e metafísico simultaneamente. E – questão das questões! – ignora e teme o fim último, ou seja, o que há para além do fim desta vida, a única que tem como certa, porque a vive.




           René Descartes                       Einstein                          Espinoza
Então, presume-se que, num mundo não muito distante, não havendo as religiões institucionalizadas, restará ao Homem o Deus de Espinoza e de Einstein – O TUDO EXISTENTE, NELE TUDO SE REALIZANDO, ELE TUDO CONTENDO EM PERENE TRANSFORMAÇÃO  NA GRANDE HARMONIA UNIVERSAL – o Deus que faz as delícias da razão dos que já agora se apercebem da falácia de todas as religiões existentes, falácia dos seus deuses, das suas verdades, dos seus dogmas, tudo invenções, fantasias, construções arquitectadas por uns quantos ditos iluminados e inspirados por Deus, obviamente o seu Deus também ele inventado. Será este Deus suficiente para criar um mundo fraterno, sendo aliás evidente que as religiões actuais não conseguiram tal desiderato?
Não há dúvida: as religiões actuais ajudam os crentes a suportar as agruras da vida, com os olhos fitos no Céu, no Paraíso de todas as delícias, numa vida eterna de pleno gozo, bem como a própria morte, morte que é vista como a libertação deste invólucro da alma que é o corpo.
Poderemos dizer que, ao longo da História, de uma maneira geral, apesar dos muitos crimes praticados em nome de Deus e da religião, seus dogmas, suas verdades…, as religiões serviram para “domesticar” o Homem, para incutir nele princípios éticos e morais, bem como de solidariedade dos mais poderosos para com os mais fracos. Quanto aos crimes, basta relembrar todos os praticados pelos judeus, em nome de Javé, para conquistarem a Terra Prometida, tudo passando ao fio da espada; todos os crimes praticados pelos muçulmanos para obrigar à conversão os povos que iam conquistando, logo ao tempo de Maomé, mas ainda hoje, com a mesma lógica fundamentalista, tudo em nome da Alá; todos os crimes praticados pelos cristãos, já no tempo das cruzadas, mas sobretudo durante a vigência da perversa Inquisição, cerca de cinco séculos, em nome da pureza da religião e, simultaneamente, durante os descobrimentos: “numa mão a cruz na outra a espada”.
De modo algum poderemos esquecer a divisão em seitas e sub-seitas tanto dos cristãos como dos muçulmanos, havendo para aqueles, sobretudo, os ortodoxos, os protestantes e os católicos, para estes, os sunitas e xiitas que vivem no maior ódio de que há memória. Tudo inconcebível! Tudo um nonsense completo, do ponto de vista humano quanto mais do divino de que eles se arrogam.
Constata-se ainda pela História, tanto antiga como actual, que as religiões não conseguiram evitar todos os massacres cometidos pelos senhores da guerra. Inúmeros, terríveis!
Então, mais selvagem ou menos selvagem, o Homem, sem estas religiões? – Penso que será mais fraterno! Algum dia, cedo ou tarde, a humanidade terá de caminhar para uma relativa igualdade entre todos os seres humanos. A igualdade total será impossível e contra naturam, já que a Natureza não dotou nem dotará a todos com iguais capacidades quer físicas, quer psicológicas. Portanto, alguma diferenciação terá de haver. Espera-se que seja justa!
Mas seja qual for o Deus que adoremos, é tão bom, tão reconfortante para o corpo e para a alma, em cada dia que se levanta, dizer-lhe: “Obrigado, meu Deus, por mais um dia, por este Sol que me ilumina e aquece e me deixa olhar as belezas da Terra, olhar o Céu azul, azul para além do qual eu sei que existem milhares de milhões de estrelas, milhares de milhões de galáxias, milhares de… ó meu Deus, quem sabe, quem algum dia saberá o que há para lá de tanta grandeza sem fim!”
Realmente, apercebemo-nos de um Universo cujo fim – se é que tem fim! – nunca poderemos perceber!
Talvez que, quando a humanidade não acreditar mais nos deuses que agora as religiões lhe oferecem, rezem assim ao Deus de Espinoza e Einstein – O TODO QUE É TUDO, A HARMONIA UNIVERSAL – e esse Deus satisfaça todos os seus anseios de uma vida eternamente plena, como, creio, já rezam agora os racionalistas!


1 comentário:

  1. Suposta carta de um ex-crente desesperado:
    «Caro senhor,
    Graças aos seus raciocínios, fez-me perder toda a minha Fé!
    Já não acredito em tudo o que me ensinaram em criança, no catecismo: o simpático e comovente Menino Jesus, a nascer numa gruta tão pobrezinho, a sua simpática Mãe, a Virgem Maria, os meus anjinhos de devoção, os meus santinhos a quem confiava todas as minhas amarguras, desgostos, sofrimentos…
    Já não acredito num Redentor, aquele que foi Menino Jesus, Filho de Deus que encarnou no seio de Maria Virgem por obra e graça do Divino Espírito Santo e que morreu na cruz para nos redimir dos nossos pecados e oferecer-nos a salvação no Céu, junto do Pai, se fôssemos bons e justos nesta vida, após a purificação do pecado original, pecado cometido pelos nossos pais Adão e Eva, no santo Baptismo.
    Já não acredito nos milagres desse Jesus durante a sua pregação, nem nos estrondosos milagres que foram a sua ressurreição ao terceiro dia, os seus aparecimentos como ressuscitado a Maria Madalena e aos apóstolos, a sua majestática subida aos Céus de onde um dia havia de vir a julgar os vivos e os mortos, no fim do mundo.
    Já não acredito nesse Juízo Final em que os bons iriam para a direita de Deus – o Céu – e os maus para a sua esquerda – o Inferno!
    Já não acredito nem em anjos nem em demónios. Já não acredito na vida eterna, no Céu, junto de Deus, junto dos seus anjos e seus santos, na corte celestial.
    Enfim, já não acredito em nada do que me diz para acreditar o Credo Católico!
    Agora, que me resta para dar sentido a esta vida que me ensinaram ser uma passagem para a outra, a vida eterna, num Céu junto de Deus, numa felicidade perene, sempre sorridente, sempre jovial, sempre gozoso? Que me valem os sacrifícios, o ser bom para com os outros, o aceitar sem me revoltar o sofrimento e a morte? Enfim, que me vale viver, se esta vida é tão efémera que mal se começa logo ali se acaba, como acabam todas as vidas de qualquer ser vivo, vindo da Natureza e nela se reintegrando para sempre, num total esquecimento do que um dia foi?
    Tanta pergunta sem resposta deixa-me desesperado, completamente desesperado porque sem sentido para a vida. VOCÊ ROUBOU-ME O MEU SENTIDO PARA A VIDA!
    Por isso, carradas de razão que tenha nos seus raciocínios racionalistas, não lhe agradeço, mas condeno-o com toda a veemência! É que não tenho salvação possível em qualquer horizonte que vislumbre!»

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