sábado, 12 de janeiro de 2013

Quem me chamou Jesus Cristo? O Menino Jesus existiu? (11/?)

IV
A inspiração de Nicodemos
    Quando regressado de Roma, ainda mesmo antes de casar, já Nicodemos, com o seu prestígio e saber, se impunha na classe sacerdotal e servidores do Templo, assumindo com naturalidade o título de fariseu, não pretendendo no entanto guindar-se a sacerdote ou mesmo a sumo sacerdote, o que continuava a ser de cunho hereditário, sendo apenas elegíveis para tão alto cargo os descendentes do longínquo Arão, o irmão de Moisés. Ora não havia tal “tradição nobiliárquica” na família que tinha enriquecido e se tinha notabilizado à custa do grande esforço e talento do pai. Por curiosidade, refira-se que Caifás era o 68º sumo sacerdote a contar de Arão, aquando da paixão e morte a que me sujeitaram.
    Assim, sempre que se encontrava em Jerusalém, subia ao Templo para participar activamente nas discussões sobre a interpretação da Lei e das Sagradas Escrituras. A discussão mais acalorada e que gerava maior celeuma era sobre a problemática do trabalho ao sábado, discutindo-se, por exemplo, se era trabalho dar comida aos animais, preparar a sua própria comida, levar tachos e panelas para ir picnicar fora de casa com os vizinhos ou amigos. E ninguém julgue que estas triviais questões não criavam dores de cabeça àqueles sábios intelectos. No caso do transporte das panelas e tachos, os doutos fariseus chegaram à conclusão de que o melhor mesmo era unirem as casas de amigos e vizinhos por tabiques ou paredes para que fosse todo o conjunto considerado apenas uma casa onde então já poderiam circular à-vontade sem cometer pecado contra Javé ou transgredir a Lei mosaica. Difícil Lei, não era? Aliás, havia histórias ainda mais caricatas! Dizia-se que um tal Elisha ben Avhuah, nome meio árabe meio judeu, certamente semita, desafiou a Escritura e com ela Javé, cometendo uma gravíssima falta, pecado dificilmente perdoável, ao decidir dar um belo passeio, em dia de sábado, montado no seu cavalo branco, pelo Monte do Templo; é que montar a cavalo era considerado trabalho... Assim não o entenderia, no entanto, Elisha que, de espírito mais evoluído e rebelde devido à sua ainda juventude, acharia ridícula tal proibição ou tal interpretação da Lei por sacerdotes ou doutores que, não podendo eles possuir aquele luxo, também não permitiam aos outros que dele usufruíssem em dia de sábado ou no Dia da Expiação... Conta-se ainda que os mais radicais, entre eles os essénios, praticamente não se mexiam em todo o dia de sábado, nem sequer comendo, trabalho já considerável, para não terem de sair a dar desaguamento aos produtos rejeitados pelo organismo após lauta refeição, ficando o problema desse modo resolvido até ao dia seguinte...
    Nicodemos, com a sua formação ecléctica greco-romana, apesar de fariseu – e os fariseus juntamente com os essénios eram considerados grupos piedosos e portanto cumpridores da Lei até ao mais ínfimo pormenor – via nestes esmeros de interpretação tempo perdido e um coarctar demasiado forte das liberdades da pessoa, o que o incomodava fortemente. Mas era voz que clamava no deserto, sentindo-se sem força nem apoio quer dentro do próprio clã farisaico, quer no meio daquele considerável e venerando mundo de anciãos, arvorados em defensores da Lei e das tradições. Aliás, quando a interpretação se tornava mais difícil, era à Tradição que se recorria para continuar nos usos e costumes por todos aceites como sendo a vontade de Javé. Pelos séculos fora, será também à Tradição e suas piedosas invenções que irão recorrer a Igreja e os cristãos para doutrinarem sobre o seu Cristo, a sua Virgem, os seus santos, os seus mitos.
    Se quiséssemos mais exemplos de trabalhos proibidos aos piedosos judeus no sábado ou no Dia da Expiação, poderíamos mencionar: apanhar lenha, acender uma fogueira, preparar a comida, pôr a mesa, tratar um arranhão feito a apanhar a pecaminosa lenha... Eram trabalhos, eram pecado contra as ordens de Javé dadas através do seu servo Moisés e que este, segundo a Tradição, compilara nos livros da Torá. Da minha luta travada contra o poder religioso instituído a respeito de tão mesquinhos preceitos, ficou para a posteridade a frase que me celebrizou: “O sábado foi feito para o Homem e não o Homem para o sábado.”

2 comentários:

  1. Boa tarde Francisco.

    Agradeço a sua visita e desejo-lhe um feliz 2013.
    Gostei do seu blog, dos seus textos e prometo voltar.
    Um beijo para si, seja feliz.

    Maysha

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    1. Simpática visita! Espero que, não perdendo o sonho (melhor é o sonho que a fé, pois é mais humano sem deixar de ser "divino"), encontre aqui bons momentos de reflexão acerca de tantas falsidades que se apregoam como verdades por esse "santo" mundo das crenças fora... E verdades incontestáveis, vejam só!!!
      Cordiais saudações, retribuindo o seu bj.

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