quinta-feira, 10 de março de 2022

Afinal, ó Homem, quem és tu?

 Adultos, somos...

 Fisicamente, uma máquina complexa de processamento, constituída por diversos órgãos, aparelhos ou sistemas que interagem e se completam, sendo os mais notórios, o digestivo que, momento a momento, processa os alimentos com que alimentamos o corpo, transformando-os em sangue, e o circulatório que, através do coração – ai, quão poucas vezes nos lembramos de que temos coração! – bombeia o sangue pelas artérias, veias e capilares que irrigam de vida o mesmo corpo. São também estes os sistemas mais afectados por distúrbios ou perturbações emocionais, como o stress, os medos, as paixões.

Psicologicamente, somos um mundo dependente do físico para um correcto funcionamento, mas que tem vida própria, subdividindo-se nas partes intelectual e emocional, partes que, por sua vez, se apresentam com particularidades ou singularidades, considerando-se diversos tipos de inteligência (a matemática, a rítmica, a musical, etc.) e diversos tipos e graus de emoções (amor, ódio, inveja, vontade, desejo, etc.). E tudo emanando de um complexíssimo órgão chamado cérebro que, sendo pura matéria energizada, produz “milagrosamente” uma admirável não-matéria, nela incluindo a consciência, a consciência de que é capaz de produzir essa não-matéria, a consciência de percepcionar o abstracto e de imaginar o futuro, construindo-o antecipadamente, indo até à percepção da sua inexorável finitude. Um “senhor” omnipotente mas dependente do todo-poderoso ADN que, vindo no acto criador, é transmitido de geração em geração, sempre ao de leve se transmutando, talvez no intuito de aperfeiçoar a espécie (o que, infelizmente, pelo menos no caso do Homem, nem sempre acontece, quer física quer psicologicamente!) e que nos determina, à nascença, a forma e o “conteúdo” e a longevidade. E, da consciência, faz parte o chamado livre-arbítrio, essa nossa capacidade de escolher entre o Bem e o Mal, o que nos acarreta não poucas dores de cabeça e não poucas frustrações quando, vendo o Bem, escolhemos o Mal por ser mais apelativo ao prazer dos sentidos… E constatamos, com muita mágoa, que em muitos dos que governam o mundo política e financeiramente, predomina o Mal sobre o Bem, o ódio sobre o amor, a ganância sobre a solidariedade, a inveja sobre a generosidade, o espírito de guerra sobre o da convivência pacífica. Assim é, assim foi ao longo da História, Homens martirizando e espezinhando, com os mais sádicos instrumentos de tortura, outros Homens, subjugando-os, escravizando-os, roubando-os no corpo e na alma. É que o Homem ainda é uma espécie em formação e, neste momento, é capaz do melhor e do pior, dos mais nobres actos de coragem como da concepção dos maiores horrores, usando as suas nobres capacidades intelectuais para criar armas sofisticadas de destruição do seu semelhante. Tem apenas uns 4 milhões de anos. Talvez daqui a outros 4 milhões seja muito mais humano e muito menos brutal… Isto devido às suas capacidades intelectuais e morais ou éticas já que se constata que, em muitas outras espécies animais que já por cá andam há muitos mais milhões, hábitos inveterados não se alteraram, por exemplo, o da luta muitas vezes até à morte entre machos para obterem o prestígio e o controle do seu harém.

Estruturalmente, não somos mais que um pouco de matéria energizada. União de diversos componentes químicos sempre em movimento e em transformação contínua. Fruto ocasional da Natureza (se quisermos, de Deus), tendo vindo à Vida por mero acaso, pois do mesmo acto de amor entre nossos pais poderia ter nascido um outro que não nós, bastando que o espermatozoide ganhador na corrida à fecundação do óvulo fosse o companheiro do lado…

Mais: antes de existirmos, nada éramos além de uma hipotética hipótese de ser; depois, fomos/somos e voltaremos ao Nada, nada como indivíduos, matéria já não energizada mas disponível para integrar – átomos e moléculas – um outro qualquer ser vivo ou não vivo, à face da Terra.

E ainda: aparecemos a partir da união de duas partículas microscópicas que, depois de unidas, entram num processo imparável de desenvolvimento do ser originado, descrevendo uma curva ou semi-círculo, atingindo um auge e logo iniciando um declínio até ao desenlace final: o eterno esquecimento de um indivíduo que um dia foi!

E mais ainda: participamos no milagre da Vida, esse sopro “divino” que, há cerca de 3.5 mil mihões de anos, energizou diversos elementos químicos, criando-se os primeiros seres unicelulares, seres donde terão derivado todas as outras espécies, ignorando-se completamente como se terão diferenciado em animais, plantas e fungos e, depois, nas múltiplas formas, as mais bizarras em que cada espécie se dividiu (e continua a dividir), numa complexa engenharia, para que tudo se pudesse alimentar de tudo, sempre cada espécie lutando pela sobrevivência.

Enfim, não sei se frustrante se admirável: como viemos à vida, por puro acaso e sem sermos esperados pelo mundo, também dele nos iremos sem deixar qualquer rasto; nem nele nem neste fantástico Universo onde a Terra se integra, como pequenino, minúsculo ponto azul. E é como se nunca tivéssemos existido!...

Alegremo-nos, no entanto! É que, tal como nós, também a Terra, também as Estrelas, por terem começado um dia, irão acabar. A Terra terá ainda uns 4.5 mil milhões de anos de vida, as Estrelas, um pouco mais. Mas também morrerão e também será como se nunca tivessem existido, nada no Universo se perdendo mas tudo se transformando. Que Beleza! Que admirável realidade na qual tivemos o privilégio de participar, embora por um curto, curtíssimo lapso de Tempo!

Mas nós somos ainda melhores que as Estrelas ou a Terra: elas não se apercebem da sua finitude nem dela têm consciência. Nós, sim! E essa é a nossa GLÓRIA! Então, seja tristes, seja contentes com tão singular prerrogativa, saibamos SORRIR À VIDA até ao último suspiro que nos sair do peito!

 Nota – No próximo texto, dada a sua complexidade, abordaremos o tema

A vida e seus mistérios

Sem comentários:

Enviar um comentário