PARA ALÉM DO FIM
Cinco
momentos de reflexão
I
Fundamento
das nossas dúvidas, as dúvidas que estão na base desta “Vida de Cristo” narrada
pelo próprio
(Cont.)
10. Como produto judeu, Jesus foi inventado
de acordo com as antigas Escrituras e para que estas se cumprissem, dando
fôlego a um povo que estava absolutamente necessitado de um Messias salvador,
dadas as circunstâncias trágicas em que se encontrava, não se esquecendo os
seus inventores de anexar ideias de Fílon, onde os evangelhos se inspiraram para
o relato de sua pretensa vida.
11. Enfim, não deixa de ser sintomático que
Jesus Cristo não tenha deixado nada escrito de seu quando tantas personagens
ilustres do tempo o fizeram.
Conclusão:
Realmente, lendo os
apologéticos cristãos, constatamos que os seus argumentos acerca da
historicidade dos Evangelhos e da historicidade de Jesus, como homem, têm quase
sempre pés de barro e, quando não, os pés que têm ou parecem ter não dão para
andar muito!... Mas, admitindo de bom grado a existência do Jesus histórico,
vamos deparar-nos com o fenómeno da sua transformação em Messias ou em Cristo
e, megalomanamente, em Filho de Deus, atribuindo-lhe os mais espantosos
milagres! Não sendo nosso propósito alongarmo-nos, aqui, sobre tão fundamental
assunto para o início do cristianismo, apenas diremos que foi Paulo,
cronologicamente, após ter tido conhecimento de Jesus por alguns dos seus
discípulos, nomeadamente Pedro, com o qual depois se incompatibiliza, o seu
grande arquitecto, criando comunidades fora da Palestina a quem ministrava as
suas ideias acerca de Deus e da Sua intervenção na História do Homem através de
Jesus, o Cristo, orientando-as depois por meio de cartas, seguindo-se, uma ou
várias dezenas de anos depois, os evangelhos, de Marcos a João, com a mitificação
do seu herói, para “alimentar” ou firmar na fé as comunidades de Paulo e outras
que entretanto se foram formando, sendo talvez a primeira a de Jerusalém
presidida pelo irmão de Jesus, Tiago. A nova religião, que mais tarde se
chamaria cristianismo, aparecerá, nos seus primeiros tempos, como uma síntese
do judaísmo com o paganismo antigo, incorporando todas as tradições culturais e
religiosas conhecidas no mundo de então. Poderíamos, pois, sintetizar a verdade
acerca das origens do cristianismo, reflectindo criticamente sobre os escassos
dados históricos disponíveis e já atrás referenciados, opondo-nos, obviamente,
a todas as histórias do cristianismo que não obedecem ao princípio crítico de
análise e que, por isso, não devem merecer credibilidade: 1 – C. do ano 33,
Jesus morre, com c. de 38-40 anos de idade, condenado pelas entidades
religiosas do tempo, considerando-o um insubordinado ao poder
político-religioso, à morte na cruz, segundo o costume romano, mas sem qualquer
milagre a acompanhá-lo, como descreve Mateus; 2 – Os discípulos continuam a
pregar a sua mensagem de fraternidade universal, o Paraíso para os bons, o
Inferno para os maus, a ressurreição e a vida eterna, formando várias pequenas
comunidades ali em Jerusalém; 3 – os fariseus movem-lhes guerra e perseguições,
e, entre eles, encontra-se um indivíduo ambicioso e inteligente (com a dupla
nacionalidade: judeu e romano) de nome Paulo; era de Tarso; 4 – C. do ano 50,
dá-se a reviravolta em Paulo: de perseguidor passa a pregador e a apóstolo do
que ele chama cristianismo; do que ele conta da sua conversão, (Act 22, 6-16;
22,9; 26,14) tudo leva a crer ser uma metáfora da sua doença, a epilepsia,
doença a que ele próprio faz referência, chamando-lhe “espinho cravado na
carne” (2Cor 12, 78); então, sem qualquer milagre, em transe epiléptico, teve a
original ideia de aproveitar o Jesus e a sua mensagem, focando-a, sobretudo, na
ressurreição dos corpos, tendo Jesus sido o primeiro “grande ressuscitado”, mas
cuja ressurreição seria penhor da ressurreição de todos os Homens para irem,
então, e por toda a eternidade, para o Paraíso ou Inferno, conforme as suas
obras: “Se ele não ressuscitou, é vã a nossa fé!”; Paulo decide que a nova
religião deve ser pregada não só aos judeus mas também aos gentios, mais uma
ideia genial votada ao sucesso: é que a mensagem era fortemente aliciante,
primeiro, para os pobres escravos que viam, enfim, fazer justiça, tendo a
esperança da vida eterna, depois, para ricos e governantes que viram na
religião o que ainda hoje vêem: uma forma de exercer o poder sobre os outros
Homens (teor político) e, ao mesmo tempo, a possibilidade de, depois da morte,
terem um Paraíso à sua espera (esquecendo-se, claro, do que Jesus dissera no
seu evangelho: “Tu, rico, tu já tiveste a tua recompensa...”); a actividade de
Paulo durará, quer como apóstolo quer como escritor de cartas para as
comunidades que tutelava, c. de uma década, até meados do ano 60; 5 – Pelo ano
70, aparece o primeiro evangelho, narrando uma suposta vida pública de Jesus e
já muitos dos seus supostos milagres, certamente a mando de algum padre da
altura para firmar na fé as comunidades já formadas; 6 – Entre 70 e 80, aparece
o evangelista mais prolixo em milagres: Mateus; Mateus amplia Marcos e tenta
dar um certo ar de credibilidade à sua narrativa, apresentando datas
históricas, mas destruindo logo tal credibilidade, com a invenção de inúmeros
milagres totalmente absurdos, desde o nascimento de JC até à sua morte; 7 – Há
um lapso, no entanto, na narrativa: pouco se diz dos acontecimentos que
rodearam o nascimento de Jesus; e, assim, aparece Lucas a colmatar tal lacuna,
inventando tudo, obviamente, inspirando-se nas lendas sobre o nascimento de
deuses antigos, sobretudo os deuses solares, reescrevendo Mateus em outros episódios
da suposta vida de Jesus; 8 – Pelo ano 90, aparece o segundo teólogo do
cristianismo (o primeiro fora Paulo), João, com o seu evangelho, mais ou menos
enigmático acerca da divindade una e trina de Deus; 9 – Nos séculos segundo e
terceiro, as comunidades cresceram e consolidaram-se, não havendo perseguições
que fizessem demover tal movimento; foi assim que se chegou ao Concílio de
Niceia, convocado pelo Imperador Constantino, 325, onde o cristianismo
praticamente se torna religião oficial do Império, o que tornou ainda mais
fácil a sua propagação…
E assim nasceu mais uma religião, baseada na efabulação, na
imaginação de alguns, na teimosia e interesses de outros, na falsidade
aliciante de uma justiça divina, uma fraternidade universal, um fantástico
Paraíso, uma eternidade junto de Deus... Religião que arrebata consciências
frágeis e que, tendo conquistado (apenas!) um quarto do mundo, em dois mil
anos..., continua, no entanto, viva em muitos países, sobretudo junto das
classes mais pobres e mais ignorantes, explorando a sua fácil tendência para a
crença ou crendice, valorizando tudo o que tenha cheirinho de milagre ou de
sobrenatural, milagre e sobrenatural obviamente inexistentes…, comandada e
dirigida de Roma pelo todo-poderoso e corrupto Vaticano – pese embora a actual
lufada de ar fresco nele introduzida pelo Papa Francisco – com a não menos
poderosa Congregação para a Causa dos Santos a aceitar supostos milagres aqui e
ali realizados por Deus, pela intercessão deste ou daquele candidato a santo…
Tudo, obviamente, sem qualquer consistência racional ou científica, digam
embora eles o contrário!
E Religião que viria, seiscentos anos mais tarde, a ter uma
grande adversária ou rival: o maometismo, cujo avanço avassalador e rápido o
fez na segunda maior religião monoteísta organizada do mundo (sendo a de menor
dimensão a judaica com o seu Javé, tendo, no entanto, sido dela que derivaram e
onde se alicerçaram as duas outras), mas com todos os problemas que o mundo
conhece, desde que nele se impôs pela espada e, agora, com a espada, (melhor,
com bombas!) se trucidando, sobretudo nas suas duas grandes seitas: sunitas e
xiitas. Que Deus, santo Deus, poderá aprovar tal religião, tais religiões, tais mortandades?! Mas
é a realidade! A do cristianismo, mais em séculos passados, e a do maometismo, nos nossos tempos, quase ali ao nosso lado...
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