À procura da VERDADE nos LIVROS SAPIENCIAIS e POÉTICOS
ECLESIASTES (ou Coélet) – 1/5
- Diz-se na Introdução: “O Eclesiastes (…) foi certamente escrito no
decorrer do séc. III antes da nossa era. (…) Livro que afinal se
mostra
profundamente crítico, lúcido e realista.” (ibidem). Fala-se
também da
“densidade estranha desta obra” e afirma-se ainda que
“o discurso oscila entre
a repetição do antigo, a sua negação no
presente da experiência quotidiana, e a
busca interrogada que ainda
não obtém respostas. Daí a complexidade (…), as
diversas leituras
possíveis (…), a aparente multiplicidade de linhas
teológicas.”(ibidem)
E, com rara maestria do “nosso” comentador, continua-se:
“Rigorosamente, tal como o seu predecessor Job, Coélet dá corpo a
um genial
sopro de crítica. Frente à doutrina anterior da retribuição que,
calma e
serenamente, defendia que o mal era castigado e o bem
premiado, na vida
(terrestre), com toda a sorte de sucessos e bens,
Job dá uma primeira pedrada
no charco conformista (9,22; 21,7), a
partir da desgraça que o privou de tudo,
inclusive da sua integridade
física. Coélet vai mais longe e, com a morte
sempre no horizonte,
questiona teologicamente o estatuto da vida e a sua
organização,
denunciando o absurdo da condição humana. Fá-lo com vigor, em
termos fortes, que não adianta cristianizar antes do tempo. Verifica a
inutilidade do esforço humano…, o gosto a cinza que fica na boca
depois de ter
saboreado os mais preciosos bens: Ó
suprema fugacidade!
Tudo é vão, fútil, desengano! O enigma do destino final
gera a angústia
(3,22; 6,12…). A justiça, o amor, as oportunidades, o poder
as
riquezas são outros tantos enganos que rapidamente deixam
desventrar o seu
vazio. (…) O fracasso dos sábios, as decepções da
existência, o balofo
inconsistente dos chamados bens, deixam o
Homem despojado e, de algum modo,
tendido para o absoluto. A
experiência radical do limite projecta-o para uma
revelação mais alta.
Assim, é a inspiração divina tanto capaz de promover
verdades,
como senhora de as derrubar, quando ficam aquém da vida ou
fundam na
Terra seguranças apressadas.” (ibidem)
Com esta extraordinária introdução – extraordinária porque este
exegeta retira
ao livro qualquer veleidade de ser de inspiração divina,
logo podendo/devendo
considerar-se livro não bíblico! – ficaria quase
tudo dito, se não fosse muita
a nossa curiosidade em “ver” com os
próprios olhos e… saborear este “livrinho”
que promete! Certamente
iremos encontrar bem patente a angústia da existência
humana, angústia
para a qual não há qualquer certeza de que possa ser colmatada
numa
qualquer outra vida para além desta terrena e certa.
- “Ó suprema fugacidade (…)! Tudo é fugaz! Que proveito tira o
Homem de
todo o trabalho com que se afadiga debaixo do Sol?
Geração vai, geração vem e a
Terra permanece sempre a mesma.
O Sol levanta-se, o Sol põe-se voltando
depressa para o lugar onde
novamente se levantará. (…) O que aconteceu, de novo
acontecerá; e o
que se fez, de novo será feito: debaixo do Sol não há nenhuma
novidade.
Às vezes, ouvimos dizer: Vede,
aqui está uma coisa nova! Mas ela já
existiu em outros tempos, muito antes
de nós. Ninguém se lembra dos
antigos, e aqueles que existem não serão
lembrados pelos que virão depois
deles.” (Ecl 1,2-11)
- Santo Deus, que “verdades” já por nós debatidas noutros contextos!
Poderia ainda, como então fizemos, ter acrescentado: “E quem se lembra
de que
não será lembrado pelos que virão, tal como não lembra os
que já se foram?” E
ainda: “Porque vivemos como se o amanhã fosse
sempre amanhã, como se o suceder
de manhãs a outras manhãs nunca
mais acabasse?”
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